quarta-feira, 24 de junho de 2020

Vigilante flagra pica-pau-do-campo com mutação rara em Iperó



Conhecido como “flavismo”, fenômeno é causado pela perda de melanina.

Por Gabriela Brumatti, Terra da Gente, com edição do DT

23/06/2020 | Cabeça e pescoço amarelos em contraste com um topete negro. Barriga e asas barradas. Essa é aparência comum de um pica-pau-do-campo, uma ave facilmente identificada especialmente por essa característica coloração. Mas, em uma chácara na cidade de Iperó (SP), o vigilante Edilson Pereira, 54, flagrou indivíduos que fogem à coloração típica, com poucos resquícios das cores originais e predominantemente brancos.

O primeiro contato de Edilson com uma dessas aves mutantes da espécie ocorreu ao acaso. “Estava na chácara sem fazer nada, de repente, chegaram quatro pica-paus-do-campo sendo um deles branco. Meu coração ficou batendo mais forte. Pensei: ‘vou ter que fazer uma imagem dessa ave, é uma raridade’”, relembra ele que tem como hobbie a fotografia e a observação de natureza.

Pica-pau-do-campo portador de mutações genéticas foi flagrado pela primeira vez em 2019 pelo observador — Foto: Edilson Pereira/VCnoTG

O registro feito, porém, não ficou bom o suficiente e Edilson queria repetir a sorte. Para encontrar esse pica-pau diferente, voltou à chácara na semana seguinte e adotou uma estratégia: seguiu o canto da espécie. O plano deu certo e conseguiu identificar o bando de pica-paus-do-campo e o integrante especial. “Eles são muito ariscos, então foi duro! Minha maquininha é simples, mas mesmo assim consegui filmar a ave umas outras cinco vezes”, vibra.

Mas se a história de contato com um indivíduo como esse já parecia impressionante, há poucos meses, uma nova surpresa aconteceu: Edilson filmou um filhote com a mesma mutação, o que indica que agora o grupo conta com dois indivíduos apresentando o fenômeno!o grupo conta com dois indivíduos apresentando o fenômeno!

As imagens feitas pelo vigilante mostram detalhes da composição da coloração na plumagem, hábitos de alimentação da espécie e o convívio em grupo desses integrantes. “Eles se davam muito bem e ficavam todos juntos, não brigavam. Eu nunca vi algum pica-pau excluindo os brancos”, comenta o observador.

Apesar de não provocar a discriminação no grupo, o flavismo que acomete essas duas aves pode deixá-las mais expostas a predadores e menos camufladas. Ao contrário do albinismo que representa a escassez total de cores na plumagem e olhos das aves e do melanismo que confere coloração mais escura ao indivíduo, especialistas definem o flavismo como a mutação onde há ausência parcial da melanina e, dessa forma, ainda conserva um pouco da cor original da espécie.

Detalhes como esses, nas imagens feitas por Edilson, estão presentes na região do pescoço do pica-pau-do-campo, que apresenta fragmentos do forte tom amarelo característico.

Pica-pau-do-campo flavístico apresenta a coloração diluída, devido à perda parcial de melanina — Foto: Edilson Pereira/VCnoTG

Esse tipo de condição pode ser hereditária ou não, o que justificaria esse filhote flagrado ser descendente da primeira ave que Edilson registrou assim. Mas fatores ambientais como desnutrição, ingestão de toxinas, contato com parasitas, choque e até a velhice podem induzir a aparição dessa característica, como afirmam artigos científicos.

Pica-pau-do-campo

Muito comum em grande parte do Brasil o pica-pau-do-campo (Colaptes campestris) é uma espécie que pode ser vista até em áreas urbanas. Mas não pense que esse domínio territorial tão extenso é natural, já que a ave foi estendendo sua habitação, em função dos desmatamentos. Seu habitat típico justifica o nome: campos e cerrados, onde se desloca próximo ao chão e captura insetos no solo.

Apesar de viver no solo, o pica-pau-do-campo se abriga em árvores ao se sentir ameaçado e, assim, extermina insetos dos troncos — Foto: Arthur Goulart/VCnoTG

Curiosidades à parte, os pica-paus possuem uma secreção produzida por uma glândula da mandíbula que possui a consistência de uma cola. Ela faz com que a língua desses animais funcione como uma vara de visgo: após perfurarem a madeira ou o solo, a estrutura ajuda a capturar os insetos que vivem no interior. Quando os filhotes precisam ser servidos é esse órgão que ajuda na coleta dos alimentos que são acumulados no bico pelos pais e regurgitados aos pequenos.

A alegria de flagrar hábitos tão comuns à espécie, mas vindos de indivíduos bem diferentes se comprova pela fala do vigilante. “Pra mim foi algo muito especial, meu coração batia forte de ver algo que para mim é raridade”, comenta.

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