Desaparecimentos fazem parte dos milhares registrados no Brasil e que ainda não foram solucionados. Todo ano 250 mil pessoas desaparecem. A cada 10 casos no Estado de São Paulo, quatro são crianças ou adolescentes, aponta o Ministério da Justiça.
Por Paola Patriarca, G1 Itapetininga e Região, com edição do DT
(Foto: Lucas Cerejo/TV TEM)
30/08/2018 - O quarto continua o mesmo. As roupas e os brinquedos usados pela menina Juliana Soares Conceição, de 11 anos, ainda não foram retirados do lugar pela família, em Tatuí. Apesar da criança estar desaparecida desde o dia 6 novembro de 2016, após sair de casa para brincar com os irmãos, a mãe Ilzoneide Soares da Silva diz que ainda não perdeu a esperança de encontrá-la.
“Sinto tanta falta dela, tanta falta. Ainda ando pelas ruas procurando porque não me conformo de ela ter sumido. Não tem como deixar de procurar, é minha filha. Queria que ela estivesse aqui. Ainda creio que ela possa voltar para casa. Ninguém consegue acreditar no que aconteceu”, diz.
A mesma esperança move a família da menina Gabriela Aparecida Alves, que desapareceu na manhã de 28 de maio de 2015, em Tietê, após levar os irmãos à escola. A polícia encerrou o caso devido à falta de provas que apontassem o paradeiro da menina ou do corpo dela.
Esses dois casos no interior de São Paulo fazem parte dos milhares que são registrados no Brasil e que ainda continuam sem solução. Conforme o Ministério da Justiça, a cada ano são 250 mil desaparecidos no país - 40% deles crianças ou adolescentes no Estado de São Paulo.
Em 2017, foram 82.684 registros de desaparecimentos no Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Contudo, não há uma estatística oficial sobre crianças desaparecidas e o site de Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Desaparecidos, criado pelo Ministério dos Direitos Humanos, está fora do ar e desatualizado desde o início de 2018.
O G1 conversou com as famílias para saber como ficam diante da falta de informações e do arquivamento dos inquéritos.
A reportagem também ouviu representantes da Polícia Civil, da Comissão da Criança e do Adolescente do Conselho Estadual de Direitos Humanos e da Associação Brasileira de Busca e Defesa à Criança Desaparecida para saber sobre o reflexo da falta de estatística oficial no país.
‘Minha menina’
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Juliana Soares Conceição de 10 anos sumiu após sair para brincar (Foto: Arquivo Pessoal) |
Domingo, 6 de novembro de 2016, Tatuí)
Juliana saiu com os outros três irmãos, de 6, 9 e 13 anos, para brincar na rua onde moram, a Pedra Ribeiro Abrame. Era domingo e estava ensolarado. Os irmãos voltaram, mas Juliana não.
Na época, imagens de uma câmera de segurança registraram o momento em que ela conversou com um homem em frente ao bar que fica na mesma rua da casa. Ele foi ouvido posteriormente, mas as investigações apontaram que não tinha ligação com o desaparecimento da garota.
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Juliana Soares Conceição sumiu ao sair para brincar na rua com irmãos em Tatuí (Foto: TV TEM)
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Para Ilzoneide, o desaparecimento da filha ainda é um mistério após quase dois anos. Entretanto, ainda mantém a rotina de fazer buscas pela região.
“Não consigo entender. Fizemos buscas, achamos até um suspeito, e nada. Como pode uma criança sumir assim e até agora não sabermos o que houve? Fico inconformada até hoje. Por isso, continuo buscando até encontrar minha menina”, ressalta.
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Ilzoneide Soares da Silva ainda espera encontrar a filha em Tatuí (Foto: TV TEM) |
A mãe conta que desde o desaparecimento vive com medo de que alguma coisa possa acontecer com seus outros filhos.
“Agora não deixo os meus outros filhos saírem sozinhos na rua. Sempre que eles vão brincar fora de casa vou junto ou peço para um vizinho acompanhá-los. Até na escola não deixo irem sozinhos mais. Eles até chegam atrasados, pois estudam em escolas diferentes, mas levo e vou buscar”, explica.
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Equipes foram guiadas por cães farejadores até matagal para buscar Juliana (Foto: TV TEM) |
De acordo com o delegado Agnaldo Ramos, da Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Itapetininga, o inquérito continua aberto, mas não há pistas sobre o paradeiro de Juliana.
“Fizemos buscas e nada. Um suspeito chegou a ser preso, mas as investigações apontaram que ele não estava envolvido no sumiço da garota e foi liberado. Encontramos roupas queimadas, mas o laudo apontou que não eram da Juliana. O caso segue em aberto, mas sem pistas de onde ela possa estar. Fizemos tudo que podíamos em relação às buscas e as investigações continuam”, afirma.
Quarto de Juliana ainda continua com brinquedos e roupas da menina (Foto: Arquivo Pessoal) |
De todos os dias sem sua filha, a mãe afirma que o mais triste é o seu aniversário, em 8 de julho. “Não posso mais fazer festinha. Choro muito toda vez que lembro dela. Quero minha filha, quero acabar com essa agonia”, diz.
Sem solução
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Gabriela Aparecida Alves sumiu em Tietê em 2015 (Foto: Reprodução/TV TEM) |
28 de maio de 2015, Tietê (SP)
Gabriela saiu para deixar os dois irmãos mais novos na creche, mas não voltou para casa.
Segundo testemunhas, ela foi vista pela última vez por um vizinho na rua onde morava, conversando com um homem. Ele estava ao lado de um Gol vermelho, modelo antigo, com vidros escuros e rodas pretas.
O homem chegou a ser preso, mas no dia 1° de julho ele se enforcou na cadeia, segundo a polícia. Ao lado do corpo foi encontrado um bilhete em que o suspeito dizia ser inocente.
A polícia encerrou o caso devido à falta de provas que apontassem o paradeiro da menina ou do corpo dela. Na época da prisão do suspeito, buscas com cães farejadores e equipes da polícia foram feitas nas proximidades da casa do homem, mas nada foi encontrado.
Exames revelaram que no carro dele havia manchas de sangue, mas não houve confirmação se era de Gabriela.
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Rosemary Aparecida da Silva ainda espera que neta seja encontrada (Foto: TV TEM) |
Na época, a mãe da criança, Lucinéia Cristina da Silva, passou por atendimento psicológico. “Sempre esperando um telefonema, alguém chegar e dar uma notícia. É duro, viu, não é fácil”, contou, emocionada.
A última entrevista que a família de Gabriela deu foi em 2016. Para a produção desta reportagem o G1 tentou entrar em contato com parentes para falar sobre o desaparecimento da menina, mas ninguém foi encontrado.
Investigação
Os casos das duas crianças ainda são um mistério para a Polícia Civil. Mas assim como esses dois inquéritos, muitos continuam sem solução no estado de São Paulo.
Segundo a Polícia Civil, a Delegacia Seccional de Itapetininga, responsável por 14 municípios, registrou, até 28 de agosto de 2018, 168 casos de desaparecimento.