Captura de rins, fígado e córneas aconteceu sábado; intenção é criar comitêDo jornal O Progresso de Tatuí - A equipe da UTI (unidade de terapia intensiva), da Santa Casa de Tatuí, teve uma de suas maiores conquistas, neste mês. O setor que quase chegou a ser fechado em outubro de 2008 (razão que motivou a intervenção da Prefeitura, concluída no início deste ano) viabilizou, na madrugada de sábado, 17, a primeira cirurgia de retirada de órgãos para transplante já realizada no município.
O feito mobilizou a equipe do único hospital da cidade, que estuda a criação de uma comissão de transplante. A captura de rins, fígado e córneas ficou a cargo de equipes de dois conceituados hospitais, o “Albert Einstein” e o HC (Hospital das Clínicas). Os profissionais foram acionados pela médica coordenadora da UTI, Vivian Menezes Irineu, na noite de sábado. “Eles fizeram as retiradas de órgãos de uma paciente que teve morte encefálica”, explicou.
A paciente, uma mulher identificada como Maria Aparecida, envolveu-se em um acidente automobilístico em rodovia próxima a Tatuí. Socorrida pelo Corpo de Bombeiros, ela precisou ser transferida para o Pronto-Socorro Municipal “Erasmo Peixoto”. De lá, foi internada no hospital com um quadro de traumatismo craniano e trauma abdominal. A mulher dirigia um veículo quando, segundo descreveu o marido – que não teve o nome divulgado –, teve um mal súbito.
O marido contou que, a princípio, estava na direção do veículo. Cansado, ele teria pedido para que a esposa assumisse o volante. Em determinado ponto do percurso, a mulher teria passado mal e o marido, não conseguido controlar o automóvel. O veículo saiu da pista e capotou. O filho do casal, um menino de oito anos, também estava no automóvel. O marido sofreu escoriações leves e a criança teve fratura numa das pernas.
Após a constatação de morte encefálica, a médica da UTI deu início aos procedimentos que permitiram a doação de órgãos. O primeiro passo consistiu numa “prova”. “Consegui fazê-la às 22h. Foi então que acionei a OPU (Organização de Procura de Órgãos) da cidade de Botucatu”, descreveu.
Além das equipes especializadas, Vivian acionou familiares de Maria Aparecida. “Comecei a explicar o caso e tentar ver se os familiares teriam a intenção de doar. Meu papel é este. Eu senti que a família estaria aberta para isso e dei continuidade nos procedimentos”, contou.
Profissionais da OPU de Botucatu chegaram ao hospital de Tatuí durante a madrugada de sábado. “Eles vieram fazer vários tipos de exames”, disse a médica. Segundo ela, além de familiares da vítima, que é de São José dos Campos, as equipes receberam autorização do marido da vítima para prosseguir.
Os exames feitos pelos profissionais de Tatuí e de Botucatu, que atestavam a morte encefálica, tiveram de ser repetidos por um neurologista. “Foi preciso trazer uma máquina para Tatuí, para que fosse feito o eletroencefalograma”. Na sequência aos exames, a OPU informou a Central Nacional de Transplantes (responsável pelo gerenciamento de uma fila única de pessoas à espera de órgãos). A central, por sua vez, acionou os hospitais de São Paulo.
O “Albert Einstein” coletou o fígado, o Hospital das Clínicas, os rins e as córneas. “Esta é a primeira vez, em seis anos, que eu consegui viabilizar uma retirada de órgãos para transplante”, citou a médica da UTI da Santa Casa de Tatuí. Desde 2005, foram 20 tentativas de convencer familiares das vítimas a permitir a retirada dos órgãos. “O pessoal ainda tem muito receio de doar, além de estar em choque, uma vez que grandes doadores vêm de acidentes”, analisou.
A falta de informação, de acordo com a médica, pode levar familiares e parentes a não concordar, num primeiro momento, com as doações. O problema está justamente no fato de que o órgão a ser doado precisa ser retirado “o mais breve possível”. “Ficamos muito satisfeitos com a conquista. A nossa intenção é montar uma comissão de transplantes”, comentou.
Este comitê ficaria responsável por municiar os familiares de informações sobre a importância da doação. Também se encarregaria de providenciar os exames necessários para a constatação da morte cerebral. A comissão não só aumentaria as chances de se obter novos doadores, mas de sucesso dos transplantes. “A coleta dos órgãos tem de ser feita no local em que o paciente está. Como geralmente são pessoas que tiveram morte encefálica, elas ficam muito instáveis. Transportar, nestes casos, não seria viável”, finalizou Vivian.
Matéria publicada pelo jornal O Progresso de Tatuí no dia 25.12.2011