quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A doce Tatuí

Conheça um pouco da tradição doceira da cidade, no interior de São Paulo. Tem suspiro, pão-de-ló, queijadinha (e muito mais)

Rita Grimm, de Tatuí, especial para o iG São Paulo 

Foto: Rita Grimm
Os suspiros, especialidade da Celina, em Tatuí: prontos para ir ao forno


Tatuí é uma cidadezinha de 110 mil habitantes, no interior do Estado de São Paulo. Fica a 60 quilômetros de Sorocaba e a 150 quilômetros da capital e tem pelo menos três apelidos: cidade ternura, capital da música e terra do doce.

Cidade ternura é uma referência ao hino em homenagem à cidade (“Tatuí, cidade ternura, terra querida onde vivemos, tens filhos de grandes méritos, é justo que os louvemos"). É a capital da música por sediar o Conservatório Dramático e Musical de Tatuí Dr. Carlos de Campos. Trata-se da maior escola de música da América Latina. O terceiro apelido, terra do doce, é o material de investigação do iG Comida. Em algumas reportagens a partir desta, vamos mergulhar no universo de escondidas fábricas familiares. São histórias de gente que está no ramo do doce desde os tempos dos avós.

Foi em um ambiente interiorano das décadas de 1950 e 1960 que os cidadãos de Tatuí se habituaram a encomendar, comprar e comer deliciosos doces caseiros feitos por senhoras quituteiras. Nessa época, as preocupações comerciais eram secundárias. As senhorinhas faziam tudo em suas próprias cozinhas, na maior simplicidade. Era um tempo de portões sempre abertos e de footing na pracinha (como na Lins da novela Estúpido Cupido, do escritor Mario Prata, que os mais velhos, com certeza, devem se lembrar).

A pioneira desses doces foi uma senhora chamada Belarmina de Oliveira Campos. Ela aproveitava os produtos da região (frutas da época e tubérculos) para fazer doces caseiros como os ABC (abóbora, batata-doce (roxa e branca) e cidra). Sua casa ficava na região central da cidade, na rua XV de novembro, e vivia cheia de gente atraída pelo açúcar. Enquanto Belarmina preparava tudo, a freguesia ficava pela cozinha “proseando”. Sua fábrica seria vendida para uma família local, dando origem à tradicional Doces Caseiros Avenida.

O perfil agrícola da cidade facilitou o acesso a uma grande variedade de frutas frescas. Novas doceiras surgiram. Tomires Soares, nessa época, não vencia as encomendas de fios de ovos e rocambole de goiaba (a goiabada era feita por ela), comidinhas famosas em todas as festas.





Foto: Rita Grimm
Bolos de festa das herdeiras da dona Lucha.


Olinda de Paula Martins era conhecida por vender a goiabada mais cremosa, a goiabada cascão, os figos cristalizados e em calda, os doces de coco e de laranja. Tinha freguesia fiel e na época de Natal sua casa era um festival de caixas de figos cristalizados destinados à capital.

Quando se tratava de grandes ocasiões, não podiam faltar os bolos e doces finos de Idalina Rocha Brandão, a dona Lucha, presentes em todas as festas, como nos aniversários da atriz tatuiense Vera Holtz, por exemplo. “O pão-de-ló recheado da dona Lucha era coberto com fondant. Fez parte da minha infância e da infância das minhas irmãs”, relembra Vera. Os doces da dona Lucha eram finos e delicados, inspiraram muita gente na cidade. Sua filha, Clara, absorveu os segredos da família e, por sua vez, já tratou de repassá-los para a filha Fernanda, mantendo assim a tradição de doces finos na cidade e em sua casa.

Os doces artesanais da Estrela D'Alva

A família do senhor Antônio Carlos de Almeida Rosa, na década de 60, fazia doces caseiros para consumo próprio e no ano de 1970 começou a comercializá-los. Eram duas opções: abóbora e laranja. Ambos em calda. Desde pequeno, Antônio Rosa acompanhava da cozinha a movimentação de doces em sua casa. Aos 14 anos, ajudava os pais em quase tudo. Com o legado, acabou aprofundando-se, desenvolveu novos produtos e expandiu o negócio. Os filhos, Rafael e Tatiana, estão junto com ele na produção dos 500 quilos de doce por semana, ao mesmo tempo que tocam uma reforma para ampliação das instalações.

Foto: Rita Grimm
Bombocado e queijadinha assados no forno da Estrela D'Alva: a cada dia da semana, um aroma diferente


Hoje, a empresa chamada Estrela D’Alva está com seus fornos aquecidos para o mercado. As grandes salas exalam aromas. Cada dia da semana é designado a preencher os tachos de cobre com algo diferente: às segundas, só frutas; às terças, beijinho, cajuzinho, casadinho e olho-de-sogra; às quartas, doces ABC; às quintas, doce de leite; sexta-feira é dia de fazer tudo com coco e cristalizados. Nos fornos, a semana se divide entre queijadinhas, quindins, bombocados, pudins e cocada assada. Tudo artesanal, supervisionado pela própria família.

Doces para sempre

Daquela cidade dos bailes de debutantes, de fogões à lenha, de leiteiros em charretes transitando diariamente nas ruas, das matinês de cinema e dos grandes carnavais, muita coisa não existe mais. Mas o doce, sim. Os tatuienses dão sempre uma palavrinha sobre as famílias doceiras, recomendam algum especialista “das antigas” ou uma conhecida que faz delícias. Tem a Nilza das especialidades com milho, a Celina dos fios de ovos e dos suspiros (entre outros doces), a Lourdes dos açucarados na forma de chupeta, o Caresia do bombocado, a Rose da goiabada, a Letícia do papo-de-anjo e muitos outros. Cada um com suas histórias de família, incansáveis empreendedores em suas cozinhas equipadas. Todas essas pessoas fazem de Tatuí uma terra de doce, fortalecida e ainda mais açucarada.

Foto: Rita Grimm
Os suspiros da Celina, agora assados: cada doceira, uma especialidade


Serviço

Estrela D’Alva
Rua Stélio Machado Loureiro, 195
Tatuí – São Paulo
Tel: (15) 3251 5030

Clara e Fernada – Doces Finos
Rua Coronel Aureliano de Camargo, 921
Tatuí – São Paulo
Tel: (15) 3251 4459

Doces Celina
Rua Chiquinha Rodrigues, 382
Tatuí – SP
Tel: (15) 3251 1400

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